Previsível mas problemático: o papel dos EUA na Lava Jato, por força da Foreign Corrupt Practices Act

O livro “Previsível, mas problemático: o papel dos EUA na Lava Jato, por força da ForeignCorrupt Practices Act” traz não apenas um apanhado cuidadoso das principais características da legislação extraterritorial de combate a corrupção norte-americana (FCPA), mas também levanta questões importantes e instigantes sobre sua aplicação no contexto latino-americano. Por que o Brasil? Por que a Petrobras? Por que não a Odebrecht? A Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) é uma norma que amplia a jurisdição norte-americana para crimes envolvendo corrupção, mas que não aconteceram no território dos EUA. As grandes empresas brasileiras envolvidas na Operação Lava Jato foram condenadas nos EUA, em razão da FCPA. O livro apresenta dados e padrões enunciados pela literatura. Esse conjunto de elementos autoriza a assunção de que um grande caso envolvendo empresas brasileiras era previsível. A previsibilidade existia considerando que os grandes casos normalmente acontecem em países com hegemonia regional, como é o caso do Brasil em relação à América Latina e parte da África. Além disso, empresas de alguns setores econômicos recebem, historicamente, vigilância norte-americana mais intensa que outros. O setor de petróleo e gás é, de longe, o setor econômico com mais autuações na história da FCPA. O trabalho descreve a força da jurisdição norte-americana como propulsora determinante para os grandiosos (em número de presos e na importância dos réus, por exemplo) resultados da Operação Lava Jato. Quando, porém, afastada a jurisdição estrangeira, as instituições locais aos poucos reconduziram os resultados da Operação Lava Jato aos padrões regulares de persecução local, incluindo o reconhecimento de muitas nulidades e decorrentes absolvições. Por fim, as autoras mostram problemas da transposição das ferramentas da FCPA para o Brasil e outros países latino-americanos. Segundo a lógica de corrupção como um estado de equilíbrio, desenvolvida no livro, é pouco provável que qualquer líder político latino-americano já tenha alcançado o poder sem adaptação ou tolerância a práticas consideradas corruptas. O grande caso FCPA no Brasil promoveu um recorte temporal específico e limitado, trazendo à luz condutas deletérias que passaram a alimentar uma notável repulsa da população. Essas condutas, porém, jamais foram novidade na história brasileira ou latino-americana. Não parecem fazer parte do passado, tampouco.